Em 11 de outubro último o IDPF – International Digital Publishing Forum anunciou a nova especificação do formato EPUB. A primeira vista não tenho dúvidas que esta revisão representa uma mudança profunda no que conhecemos como livro – não apenas o suporte, mas na forma de pensar e produzir cada conteúdo, bem como tudo que entendemos como e-book até hoje.
Pode parecer um tanto radical, mas sabemos que o EPUB 2, na verdade, pouco acrescentou – ou quase nada – de interatividade nos e-books. Durante toda sua existência a revisão 2.0 do EPUB teve seu uso focado na reprodução pelo meio digital do tradicional conteúdo impresso – textos e imagens. Atividade que o mercado adotou pelo nome de conversão, apesar do termo ser depreciado por muitos profissionais da área (eu mesmo me incluo nesta lista. Fica aqui o registro).
Principais formatos do EPUB 3
Documentos
XHTML5
SVG
Fontes
Open Type
WOFF
Gráficos
.jpg
.png
.gif
.svg
Audio – Video (codecs)
.mp3
H.264
V8
Mas com esta introdução parece que já estou aposentando a versão atual do EPUB para dar inicio ao uso das novas possibilidades da versão 3. Muita calma nesta hora. Sabemos que esta transição não será simples, nem fácil e muito menos rápida.
Ainda bem que o IDPF compartilha dessa ideia. Por isso a nova especificação é clara quanto a esse tema e inclui novos mecanismos de fallback – conteúdo exibido quando o dispositivo não suporta determinada funcionalidade, como script ou video. Neste caso é inserido um texto ou imagem para ser utilizado no lugar desse recurso. E desta forma manter o “mínimo” de compatibilidade com dispositivos de leitura anteriores ao EPUB 3.
A expectativa agora com esta recomendação é que grandes empresas como Apple, Adobe, Sony, Google, entre outras comecem a povoar o mercado com dispositivos de leitura e ferramentas capazes de tirar do papel as maravilhas que o EPUB 3 promete. Ao menos a Adobe já sinaliza a integração do EPUB 3 com o nova versão do InDesign. Descubra neste artigo o que o InDesign CS6 traz de novo em relação ao EPUB e ao Digital Publishing.
EPUB 3 por dentro
Internamente o EPUB mudou quase por completo, em especial sua estrutura e organização dos arquivos. Um grupo com mais de 150 participantes esteve reunido desde maio de 2010 para desenvolver esta revisão.
A lista de tecnologias que envolve o EPUB cresceu, agora inclui entre outras: XHTML5 , SVG (nativo) , CSS3 , WOFF e Javascript . Sendo maior que a soma dessas tecnologias separadas, uma boa definição para o EPUB 3 seria um container que transforma estas tecnologias numa nova experiência de leitura. Semelhante ao W3C , as especificações intimidam pelo tamanho e quantidade de hyperlinks e referências. Mas deixo aqui um resumo sobre as novas especificações do EPUB :
1 – EPUB Publications 3.0
Arquivo XML utilizado no pacote de informações sobre o EPUB: metadata (titulo, autor, idioma), listas dos elementos contidos no EPUB, ordem de leitura, entre outros. Trata-se do antigo Content.opf com novas opçõs. Leia mais sobre o Publications .
2 – EPUB Content Documents 3.0
Esta especificação substitui a antiga – Open Publication Structure 2.0.1 na tarefa de descrever o perfil das principais tecnologias contidas no EPUB – XHTML5, SVG 1.1 e CSS 3 e utilizadas para formatar e estruturar o conteúdo.
Nesta revisão a navegação, pela tag NAV , foi incluida no Content Documents em substituição ao NCX da antiga OPF – Open Publication Format.
Contudo o EPUB 3 continua a oferecer pleno suporte ao NCX assegurando a navegação de e-books em dispositivos compatíveis apenas com EPUB 2.
Leia mais sobre Content Documents .
3 – EPUB Media Overlays 3.0
Este é o “irmão” mais novo das especificações do formato EPUB. Sua sintaxe é baseada na especificação SMIL – Synchronized Multimedia Integration Language e através de suas tags é possível associar texto e áudio na sequencia de leitura. Veja um exemplo de Media Overlay neste artigo.Leia mais sobre o Media Overlay .
4 – EPUB Open Container Format (OCF) 3.0
E por fim, Open Container Format responsável pelo empacotamento de todos as arquivos acima mencionados num grande zip, chamado EPUB. Essa especificação não sofreu significativas mudanças.Leia mais sobre o OCF.
EPUB & Web Standards
Nesta versão o EPUB incorpora de vez os padrões da web – HTML, CSS e Javascript. Mas é preciso muita cautela neste momento, pois além da incompatibilidade dos leitores com estes padrões. O próprio EPUB 3 possui características que diferem da especificação do W3C / WHATWG [ver box].
Apesar de adotar a nova semântica (tags) do HMTL5, o EPUB 3 continua a fazer referência ao XML e XHTML , em especial na sintaxe. Por isso a recomendação é manter a extensão .xhtml.
Na verdade nosso cenário futuro prevê o uso das novas funcionalidades e tags do HTML5 (section, article, nav, aside, entre outras são suportadas e melhoram a escrita e entendimento do código), bem como a inclusão de alguns atributos dedicados ao EPUB, como por exemplo o epub:type , responsável por tornar o EPUB mais acessível, possui valor apenas semântico e pode ser associado a qualquer elemento do HTML.
O epub:type permite que os dispositivos tenham mais informações sobre o conteúdo e, desta forma podendo oferecer uma melhor experiência de leitura. Assim um único arquivo EPUB 3 atende as necessidades de distribuição de conteúdo acessível, por isso a marcação DTBook foi descontinuada nesta revisão.
A relação entre HTML e EPUB está cada vez mais integrada e não poderia ser diferente, a natureza fluida do HTML atendeu como uma luva as necessidades do IDPF em produzir um formato aberto para publicações digitais dirigidas a diferentes formatos de tela. Apesar da recomendação final do HTML 5 está prevista para 2014, o IDPF saiu na frente e já implantou os principais módulos deste padrão no EPUB 3, mas acredito que o futuro de cada formato tem seu caminho próprio.
Com o HTML5 se fortalecendo para atender a produção e distribuição de conteúdo multi-plataforma para todo tipo de dispositivo, seja na forma de sites, web apps ou apps nativos. Outra boa noticia é a inclusão da linguagem MathML e suporte a formulários do HTML, contudo esse último é opcional na atual recomendação do EPUB 3.
EPUB 3 – novas possibilidades
A seguir uma breve descrição de alguns novos recursos do EPUB 3
Multimídia
O uso de áudio e video nem é tão novidade assim, em especial para os dispositivos da Apple. Com a chegada do InDesign CS5.5 ficou mais fácil incluir esses recursos no EPUB direto no documento. A questão fica pela recomendação de 2 codecs de video – H.264 (já adotado pela Apple e também reconhecido no InDesign CS5.5) e V8 (desenvolvido pelo google com código aberto, podendo ser utilizado com qualquer formato.
Sendo que o formato WebM foi desenvolvido exclusivamente para o codec V8). Essa divisão certamente irá retardar um pleno suporte ao video em novos leitores. Vamos aguardar pois este tema ainda está em discursão no IDPF. Quanto para o áudio continua reinando o bom e velho MP3.
Media Overlays
Este novo recurso permite a sincronização do texto com um arquivo de áudio, ou seja, o texto ganha destaque na tela conforme o andamento da narrativa. Através desta função diferentes publicações serão beneficiadas, permitindo, pra começar, um maior nível de acessibilidade.
Basta fazer a marcação das DIVs com texto em XHTML aos trechos de áudio. Media Overlays são transparentes em dispositivos que não oferecem suporte a essa tecnologia, ou seja, não interferem na leitura dos e-books. Veja um exemplo de Media Overlay aqui.
Gráficos e Efeitos
Javascript é sem dúvida um dos recursos mais esperados para esta revisão. Aqui a atenção triplica, pois o suporte ao javascript é mínimo atualmente, por isso o IDPF incluiu um novo objeto ao javascript – epubReadingSystem . Capaz de identificar quais funcionalidades do EPUB são suportadas por determinado dispositivo e assim permitir o uso de alertas ou fallbacks para otimizar a experiência de leitura.
Situação bem semelhante ao ambiente dos navegadores. Em pouco tempo teremos um modernizr para EPUB (javascript que informa a compatibilidade dos navegadores com os novos recursos do HTML5, CSS3, entre outros.) O formato SVG recebe total atenção no EPUB 3. Agora arquivos SVG não precisam mais do HTML, podendo figurar nativamente dentro do EPUB.
Acessibilidade
Este é um tema que recebeu profundas mudanças na estrutura do EPUB. Buscando melhorar o suporte para funções de acessibilidade, o IDPF mudou radicalmente a estrutura de navegação.
Ficando depreciado o padrão toc.ncx em troca da tag NAV, do HTML5. A especificação prevê o suporte ao NCX para atender leitores compatíveis com EPUB 2. Além de novos atributos como epub:type que permitem uma semântica melhor estruturada aumentando a acessibilidade do formato.
EPUB Style Sheets
Finalmente o EPUB chega a maturidade do CSS ganhando, inclusive, o uso de prefixo -epub para casos mais específicos, como a formatação de textos listadas abaixo:
- -epub-hyphens
- -epub-line-break
- -epub-text-align-last
- -epub-text-emphasis
- -epub-text-emphasis-color
- -epub-text-emphasis-style
- -epub-word-break
Como explicado no caso do HTML5 e Javascript, quanto tempo teremos que esperar por dispositivos de leitura compativeis com os principais recursos do CSS 3 (multicoluna, web fonts, efeitos de canto, etc) ainda é uma dúvida. Mas se o seu público-alvo usa dispositivos Apple – iPad, iPhone, então pra você muitos dos novos recursos do EPUB 3 podem ser usados agora. A apple oferece um excelente suporte aos novos padrões da web e consequentemente ao EPUB 3.
Novos rumos
A pergunta que fica é quando poderemos utilizar de forma segura e confiável essas novas funcionalidades? Sinceramente é difícil fazer uma previsão, pois fora do ambiente Apple muitos desses recursos ainda são uma promessa. O momento é propício para este fortalecimento do EPUB, visto toda movimentação do mercado editorial com o Digital Publishing para tablet.
Acredito que agora o formato EPUB ganhou músculos para se firmar como uma opção, real, e oferecer uma nova experiência de leitura através dos dispositivos móveis. Outro ponto importante é entender quais recursos do EPUB 3 agregam “real” valor ao seu conteúdo e são relevantes para o seu público. Este artigo é um breve resumo das potencialidades desta revisão, visite idpf.org e conheça a lista completa.
Sem dúvida vão surgir novos modelos de negócios e empresas – editoras digitais – que pensarão como adicionar “extras” ao conteúdo original, porque qualquer produto editorial – livro, revista, jornal – de texto puro será cada vez menos aceito pelas novas gerações.
Pra concluir: desde 1450, com a invenção da prensa por Gutenberg, a indústria editorial e gráfica evoluiu (e muito) com base no mesmo suporte – o papel. Hoje, cerca de 560 anos de depois, vivenciamos os primeiros passos de novos suportes capazes de competir com o papel – tablets e eReaders. Não é o fim, trata-se de um novo começo.
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