Segundo Joana Monteleone, editora da Alameda Editorial, a tendência do mercado de livros eletrônicos, tanto no exterior quanto no Brasil, é a busca de composição de acervos de bibliotecas digitais.
Com mais de 10 anos de experiência, Joana analisa o fenômeno que tem dado o tom do mercado editorial no momento. “A principal diferença em relação ao modelo de livrarias é que passamos da figura do consumidor de livros para a do usuário de bibliotecas”.
Para ela, provavelmente, os dois modelos citados acima conviverão, mas para que ambos deem certo, é preciso pensá-los em suas especificidades. Por isso, ela listou abaixo oito questões que consideramos relevantes para pensar as bibliotecas digitais.
1. Biblioteca digital não substitui biblioteca física. Ambas são experiências importantes, mas complementares. O Ministério da Educação, que tem a missão de conduzir o cumprimento da Lei da Biblioteca Escolar (12.240/10), sancionada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante a gestão de Fernando Haddad como ministro da Educação, não pode abusar do artigo 2º, que permite o uso de vários suportes, para ignorar o fato de que escola sem biblioteca física operando é escola ruim. O grande desafio de melhorar a educação nacional passa por não fingir que gadgets eletrônicos são uma espécie de emplastro Brás Cubas, que tudo cura.
2. Quando o consumidor ou o governo compra um livro, ele adquire um conteúdo específico, unitário. Quando o assunto é biblioteca, busca-se um acervo. Uma livraria vive muito dos livros da estação, que todos querem ler; uma biblioteca é útil quando sua coleção é representativa, seja pela especificidade, seja pela variedade. Uma livraria não deve ignorar a bibliodiversidade (muitos autores, editores, públicos e coleções diferentes), se quer manter um público cativo; uma biblioteca simplesmente não pode.
3. Os editores independentes, boa parte deles reunidos na Libre, mas não apenas, representam o maior e mais diversificado acervo de livros comprados pelas melhores bibliotecas públicas e privadas. Qualquer modelo de livraria digital sério tem de reconhecer este valor, dialogar com esses editores e remunerá-los pela qualidade e importância de seus catálogos. Quem privilegiar apenas os grandes grupos se parecerá com um catálogo de best-sellers, não com uma biblioteca.
4. Livraria não é mídia, é ponto de venda. Biblioteca não é ponto de venda, é espaço de consulta e estudo, muito mais do que de lazer. E isso é bom. Biblioteca que seguir a lógica de ponto de venda não vai funcionar, assim como crescem rápido, mas paradoxalmente afundam, sobretudo culturalmente, mas também do ponto de vista de sustentabilidade econômica, livrarias que vendem espaços como se fossem outdoor.
5. Remunerar bem apenas quem é mais acessado é reproduzir na biblioteca a lógica da livraria que vende espaço de mídia. Ou seja, o pior dos mundos.
6. Um dos motivos do fracasso relativo da biblioteca pública como instituição nacional, amplamente difundida no território do país, é que muitos políticos as entendem como depósito de livros, e o usuário é visto primeiro como potencial ladrão de exemplares do que como alguém que acessa o serviço público. O mínimo que se espera do universo eletrônico é que ele proporcione conforto ao usuário, e excesso de restrições não vai ajudar as bibliotecas digitais a se popularizar.
7. Numa biblioteca digital, o usuário não pode ter as mesmas restrições que numa biblioteca física, como pegar fila para acessar um livro ou ter pouco tempo para ler uma obra. Aliás, o ideal é que nesse novo mundo, o tempo não seja uma questão.
8. A prestação de contas aos fornecedores e usuários tem de ser, ao mesmo tempo, a mais simples e detalhada possível. As bibliotecas são, tradicionalmente, um espaço de questionamento e transparência. Criar uma relação de confiança entre todos os envolvidos é fundamental.
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